terça-feira, 20 de novembro de 2012

Para você, Palestina

Eu sinto o frio me trazer o sussurro escuro da noite. Escuto seus lamentos, vejo sua escuridão. Escuto as lamúrias dos séculos a me pediram refúgio. Escuto as sombras, olho a cara do mundo a respirar sua solidão e insanidade. Aceito, inconformado, sua presença, seu cheiro nauseabundo, seus sons de impermanência eclodindo em minha vista cansada de tantas cores que se pintam de cinza. Tenho as cores do mar e do céu povoado de estrelas. Mas os sons do mundo e dos absurdos trazem-me a escuridão da ignorância. Aceito cada palavra como uma flor negra que se abre ou como um caminho para o infinito absurdamente infindável do amor dos que matam e dos que amam. Aceito as dores como aceito as rosas, mas sinto bem mais seus espinhos do que suas pétalas. Rosas absurdas. Libertam seu odor para o ar sujo da cidade, o ar que comanda as desavenças do meu nariz sujo, da minha vida suja, do meu ouvido sujo, da minha boca suja... Comandam a sujeira da vida nas ruas e das guerras, da guerra suja, imunda, impronunciável desejo de morte ante tanta vida, vida que apenas desabrochou em rosa, sempre tão suja e insana guerra, guerra daqueles que tenho que escutar, cheirar, ouvir, comer, e mesmo amar, pois do mais vil excremento de suas bombas nasce minha humanidade, dela também se faz a minha vida e se faz minha morte. Sou ainda mais humano cada vez que uma bomba mata uma criança palestina.


segunda-feira, 19 de novembro de 2012

sábado, 17 de novembro de 2012

Da Série "I Love Soils"

Estudo recente da Cornell University (New York), com 480 crianças, demonstrou que solo, além de não ser danoso ao sistema digestivo, funciona como um sistema de defesa contra substâncias tóxicas e "vacina" as crianças contra diversos parasitas.

Ciência provando o que muitas comunidades rurais e indígenas já sabem há mais de 2000 anos: que terra é um tratamento para problemas intestinais.

Brinco com solo, desde criança... Hoje apenas mudou o tipo de brincadeira, mas o prazer é (quase) o mesmo.

http://www.islamiclife.com/family/2012/muddy_but_creative_hands.php


sexta-feira, 16 de novembro de 2012

O Beija Mãos

Coisa interessante de ser ver: Uma espanha, que até pouco tempo barrava cidadãos brasileiros nos seus aeroportos, beijando a mão do Brasil e pedindo que o nosso país receba seus imigrantes desempregados e faça investimentos na Europa. A Espanha decidiu seguir a tal "austeridade" à moda (e ordem) alemã com seu povo pagando a conta. Agora, tal como Portugal, Grécia, Itália e outros países europeus, a Espanha tenta desesperadamente parar o desastre. O Brasil, um dos países que melhor enfrentou a crise de 2008 ao investir no mercado interno, enquanto seu forte papel em commodities agrícolas continuava ajudando a balança comercial, está em bem melhor situação. Lições.


O PT e o “mensalão” (Luiz Gonzaga Belluzzo)

No interminável julgamento do “mensalão”, as cartas dos leitores e os blogs vociferavam: a reputação dos ministros do Supremo está em jogo. Minha inteligência se esbate em suas limitações para compreender o que pretendiam dizer tais sábios da jurisprudência. Imagino que suas elucubrações buscassem definir o resultado do julgamento à revelia do contraditório e do excurso argumentativo.
Isso permite concluir que, nos julgamentos de grande repercussão na opinião pública, devemos nos livrar das conquistas históricas do liberalismo político e da democracia que garantem ao cidadão, rico ou pobre, o julgamento fundado na argumentação racional das partes e na livre formação da convicção do juiz ao aplicar a lei ao fato.
É de uma obviedade palmar que os crimes alegados pela acusação, uma vez provados, devem ser duramente punidos, sobretudo por desmoralizarem os requerimentos de probidade que devem guiar a administração pública. Mais que isso, deformam a representação popular. No banco dos réus do “mensalão” e do “mensalinho” deveriam estar sentados o sistema partidário e o financiamento das campanhas eleitorais, engendrados com o propósito de transformar a política num mercado de balcão, onde os gritos de “compro” e “vendo” tornam ridícula a hipocrisia dos discursos moralistas.
O desempenho nas eleições, o sucesso das políticas sociais e o reconhecimento popular não absolvem o Partido dos Trabalhadores dos pecados da Realpolitik e dos empréstimos contraídos em bancos de espertezas e hipocrisias do establishment nativo. Não há outro caminho senão purgar as culpas e retomar a luta pelo avanço da igualdade e da democracia dos cidadãos, o que inclui a defesa da diversidade de pontos de vista e dos meios para expressá-los.
Na sociedade dos significados invertidos e pervertidos cabe às associações de cidadãos lutarem pela fiscalização infatigável dos poderes públicos e privados, sobretudo daqueles que pretendem se embuçar com as máscaras de senhores da liberdade. Imagino que assim podemos vislumbrar a derrota do transformismo que dá sobrevida ao pacto oligárquico que assola o País. Os senhores abandonaram os coturnos e as baionetas para recorrer aos métodos sutis e eficientes de tortura coletiva dos cidadãos com as técnicas da desinformação, do massacre ideológico e da “espetacularização” da política.
Hannah Arendt, nas Origens do Totalitarismo, abordou as metamorfoses sociais e políticas na era do capitalismo tardio e da sociedade de massa. As transformações das sociedades ao longo do século XX produziram, em simultâneo, o declínio do homem público e a ascensão do “homem massa, cuja principal característica não é a brutalidade nem a rudeza, mas o seu isolamento e sua falta de relações sociais normais”.
Trata-se da abolição do sentimento de pertinência a uma classe social sem a supressão das relações de dominação. “As massas surgiram dos fragmentos da sociedade atomizada, cuja estrutura competitiva e concomitante solidão do indivíduo eram controladas quando se pertencia a uma classe.” Em seus piores momentos, os porta-vozes do indivíduo abandonado às penúrias da multidão solitária se entregam às tropelias do que Antonio Gramsci chamou de sarcasmo de “direita”. Sempre negativo, esse sarcasmo é cético e destruidor não só da forma, mas do conteúdo humano dos sentimentos e crenças na justiça, na igualdade e na fraternidade, elementos ideológicos difundidos pelas tendências democráticas herdadas da Revolução Francesa (Antonio Gramsci, em Maquiavel, a Política e o Estado Moderno).
Invocar a justiça acima da lei é atitude típica do “homem cordial”, figura magnífica da sociologia de Sérgio Buarque de Holanda. Ao contrário do que pretendem as interpretações vulgares, o homem cordial de Sérgio Buarque não é o homem liberal da Teoria dos Sentimentos Morais, de Adam Smith, cuja “mente estava dotada naturalmente da faculdade que permitia distinguir, em certas ações e afeições, as qualidades do certo, do louvável e do virtuoso, e, em outras, aquelas do errado, do condenável e do vicioso”.
O homem cordial é avesso à impessoalidade da norma e está permanentemente empenhado em impor suas “virtudes” e sua “moral” particularista aos demais. Trata-se da caracterização mais perfeita do “coronel”, personagem das oligarquias que infestaram e ainda infestam o País com seus diktats. Outrora concentrados nos grotões do Brasil varonil, hoje se refugiam nas redações ou espalham seus mandonismos e grosserias pela web.

domingo, 4 de novembro de 2012