quarta-feira, 26 de junho de 2013

Gil, versão 7.1

Grande poeta e músico singular, 71 anos hoje.

Metáfora (Gilberto Gil)


Uma lata existe para conter algo
Mas quando o poeta diz: "Lata"
Pode estar querendo dizer o incontível

Uma meta existe para ser um alvo
Mas quando o poeta diz: "Meta"
Pode estar querendo dizer o inatingível

Por isso, não se meta a exigir do poeta
Que determine o conteúdo em sua lata
Na lata do poeta tudonada cabe
Pois ao poeta cabe fazer
Com que na lata venha caber
O incabível

Deixe a meta do poeta, não discuta
Deixe a sua meta fora da disputa
Meta dentro e fora, lata absoluta
Deixe-a simplesmente metáfora
 

sábado, 22 de junho de 2013

Oremos

Amanheci um pouco irmã Zuleide (será que posso pedir atestado médico a Feliciano?), orando por você, que se recusa a aprender que protestar tem que ter como e porquê, que não é questão de partido nem de achar que sua intenção não é boa (e que pensa que todo mundo tava dormindo e agora "o Brasill acordou"), mas tudo na vida tem que ter foco ou a Globo transforma sua insatisfação num ursinho cor-de-rosa ou numa passeata de vândalos. Orando para que você entenda as diferenças entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e para qual a sua demanda deve ser feita. Não peça hóstia ao pai de santo, é outro departamento. Amanheci Irmã Zuleide Fake, para orar (muito!) para você ler antes de postar, para se informar, para que, na sua "boa intenção", não passe por ignorante nem inocente útil. Orando por você, que é contra ou a favor sem nem saber porquê.


quinta-feira, 13 de junho de 2013

Pessoa

Nascimento de Fernando Pessoa (13 de junho de 1888), que andava de bonde por Lisboa e nunca entrou num ônibus em São Paulo.

"Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei. "

quarta-feira, 12 de junho de 2013

Praça Taksim

Revolta boa é "Primavera Árabe"
Que passa na televisão
Ou então na Praça Taksim
Talvez numa rua do Paquistão
Se for na tua esquina
No horário da academia
Ou fizer a empregada faltar
E você fazer faxina
Quero ver onde vai guardar
Essa revolta que só vai bem na Turquia

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Eric



Ontem aniversário de Eric Hobsbawm (9/06/1917 - 01/10/2012), historiador inglês nascido no Egito, intelectual hábil em discorrer sobre temas diversos. Celebro com a companhia da sua 'História Social do Jazz", com prefácio de Luís Fernando Veríssimo.

domingo, 9 de junho de 2013

Carta aos rinocerontes (César Leal, 1924 - 2013)

Não sei se estou mais presente na Terra
do que estariam uma rosa e uma dália.
Nem um milésimo das coisas que vejo diariamente

está contido em meus poemas...

Sei que o leitor poderá dizer isso agora:
"— Você não é um bom poeta! Castro Alves
é mais participante, mais exato,
transporta o mundo — ou pelo menos sua metade
no Navio Negreiro.

Mas você — que leio agora —
não me acende nenhuma luz,
agarra-se demasiadamente aos anjos,
a uma forma estéril
que não fala ao tempo,
aos pássaros,
e menos ainda ao meu coração".

Ouço-te e repito
que sou apenas pequena parte das coisas
que estão no mundo
com certeza não sou a menor parte
e, por isso, tens que me aceitar
se és um leitor e não apenas um crítico.

Se minha poesia te cansa,
peço-te: come as saladas de Souzândrade; bebe
lentamente as gotas de orvalho que fluem dos Caligramas
de Apollinaire...

Elas satisfarão tua fome e tua sede,
ou terás uma sede e uma fome tão estranhas
que suportarias ainda Maiakovski,

Evtuchenko, Voznessenki, Pound
e toda a galeria dos participantes
que ficam à tua direita e à tua esquerda?

Quanto a mim, pouco te posso oferecer:
não escrevo para los muchos
arranco de mi corazón el capitán del inferno,
establezco cláusulas indefinidamente tristes

Esgotados os estábulos aonde os teus donos
guardaram para ti alimentos tão nobres,
ainda restariam os membros do Clube dos Ultraistas,
Tzara e todos os que, à semelhança dos empregados domésticos
sopram trombetas das 6 às 6,
repetindo eternamente a contínua canção:
"somos os que andam na vanguarda do Tempo".

Quanto a mim continuarei sozinho,
solitário como um estranho rio
de um território ainda não visitado pelos geógrafos,
abrindo sem descanso a minha estrada
certo de que alguém um dia
— anjo ou demônio —
caminhará por ela até a porta do meu nome.

quarta-feira, 5 de junho de 2013

Eu-Língua


Eu falo todo dia. A língua graciosamente me faz eu. Ela está dentro e está fora. A língua portuguesa do Brasil me engole. Lambo a gramática e o falar do povo. A língua do Brasil me invade. Tudo normatizado ou belamente inculto, a língua brasileira assombrosamente me invade. Abrasileirando Portugal, me recuso à norma lusa. Tudo vira Brasil, esse falar moreno. A língua que eu falo é a língua que me faz quem sou. Sem ela sou nada. Ela é minha pátria e minha aldeia. A língua do Brasil me serpenteia. Gozo em suas mãos de letras e sílabas, murmuradas no ouvido ou nascida das ruas. Infinitamente brasileira, língua minha, o melhor de mim se desmancha em palavras tuas.