Foto: Clístenes Nascimento |
Manhã correndo pelo Lac de Saint-Mandé, tal como faço na
Beira-Rio. Esse mundo pequeno que carregamos dentro de nós. Os trabalhadores idosos
desmontam as grades da maratona de ontem. Alguns falam árabe no país dos
franceses, tão exilados de suas pátrias e costumes. A senhora apanha com o
saquinho plástico a cagada prateada da cadelinha. As mães em
carinhos aos filhos loirinhos, mestiços, negros, asiáticos... Urgente ajudar a
mulher a descer com a cama-usada-recém-comprada os três andares em espiral.
Parecia satisfeita, com a cama e a ajuda, ao deixar-me um bonne journée no qual acreditei. O corpo suado e a ducha fria. As horas
se perfumando de sabonete. A maninha fazendo bolo de milho e brigadeiros no
escondido da cozinha. A internet encurtando o tempo e a distância, o ínfimo do
tempo real, imediato, que me presenteia vida no simulacro de matar a
saudade. Não se recebe mais cartas. Não recebi cartas neste dia. Recebi
e-mails, mensagens, posts, canções, felices cumpleaños, bon anniversaire e happy birthday. Não exalavam o cheiro
das cartas, essas mensagens na tela, mas o que nos promete esse admirável mundo
novo que pudéssemos desacreditar? Nas cartas podia-se sentir a pressão do
pulso, o nervosismo, a ansiedade. As cartas nos contavam mais do que estava
escrito. A pressão ou a lentidão com que era produzida a sílaba, se vacilante
ou segura, era a mão que escrevia. Mesmo assim não posso deitar-me em queixas
aos novos tempos. Algumas mensagens,
seja por que via são enviadas, convertem-se em únicas pela indelével presença
humana, afetiva, delicada de quem as escreve, cola, copia, grava, deleta, muda
a fonte, anexa, repensa e reescreve. Os gestos não vistos, não sentidos, mas
imaginados. Então lhe acha boa para ser livre e encontrar o destino na
distância que viajam os bits. Bel Canto, onde cantores líricos servem os pratos
e as árias. Verdi e Carré d’agneau.
Puccini e mi-cuit au chocolat. Aromas
de vin rouge e sons de piano. As
luzes da mais bela cidade do mundo. A presença e a ausência dos que amamos. Esse
mundo imenso que carregamos dentro de nós.
Caro Clístenes, como vai? Visitei o seu blog para ler o texto postado "La Troisième Fois". Com sua excelente capacidade de escrever e descrever sentimentos, lugares, pessoas, imagens etc, confesso que fiquei com receio de logo perdemos um brilhante Cientista de Solos para o mundo dos famosos escritores e literários... ou eu deveria era ficar feliz em saber que neste nosso mundo da ciência, muitas vezes demasiadamente cartesiano, temos tempo e espaço para praticar outras atividades/criatividades? Parabéns pelos textos e um forte abraço!
ResponderExcluirObrigado, Caro Thiago! Fique com a segunda opção. Grande abraço!
ResponderExcluirSuas palavras remetem à memória, imagens e sentimentos...conheço essas paragens...belas e sedutoras...mas, prefiro a presença dos que amamos...estou numa fase antinômade....rsss
ResponderExcluirQuando voltar...marque um brinde, escolha uma música, uma poesia...para comemorar com as pessoas queridas a vida com toda sua beleza e fugacidade...na terra do sol...Bjs...