quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Mar Morto

Foto: Pedro Fernandes
Ele apareceu como um peixe do mar morto e engoliu todas as suas queixas azuis. Queria ver e sentir só o que desejaria. Mas isto não dependia apenas dela. Queria ter e perder só quem ela queria. Tudo é fim e tudo é começo e algumas vezes ela via uma pedra no meio. Liga o chuveiro e espera chover vinho. Na maioria das vezes cai apenas água. Mesmo assim ela se embriaga. Ele passa nu na rua e ninguém o vê. Só ela o vê. Ele tem costas escuras, pernas escuras, peito escuro, coração escuro. Olhos grandes, escuros. Um céu escuro desaba sobre ela. Ela morre de medo e de tesão da água escura que escorre da cara crua com a qual ele a desnuda. Queria que ele fosse aquele que lhe entrega as ternuras e as dores. Mas isto não dependia apenas dela. Aspira correr o mar com ele, sentados em uma baleia azul. Tenta refazer o mundo a partir da saliva e do cheiro dele. Tem medo. O mundo é muito grande, grande demais. E ela tem medo de olhos negros.

2 comentários:

  1. Pequeno escrito em lembrança da interpretação de Keira Knightley, em "A Dangerous Method".

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  2. Já li Knightley, é um leitura surrealista, mas a autora traz implícito fortes, concretos e audazes sentimentos. Achei interessante como ela descreve o Mar morto. Permita postá-lo! Embora acredite que minha tradução não esteja tão perfeita, acho que é algo assim: "O Mar morto é um morto vivo, parece mais coveiro do que defunto. Ele deita sobre toda água que adentra em seu espaço, e todo água que o alcança padece. Ainda que seja água cristalina espirrada da gruta, ou doce, corrente, nem muito fria, nem muito quente, se atravessar a mata e pular nele, enfraquece, entristece, adormece. Ele fica na região mais baixa do planeta terrestre, onde as águas se tranquilizam e falecem, transformando-se em sal. Lá a temperatura é terrível, não existe vida e as aves não pousam, pois não há árvores. O solo é crestado, os viajantes passam só de longe. Sim, ele é mesmo avarento, pois todo água que chega ele acolhe, mas jamais sangra.” Pollyana Batista.

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