sexta-feira, 18 de maio de 2012

À Flor do Preconceito


Essa sorridente garota, com todos os seus direitos da juventude e da liberdade da inconsequência (e, quem sabe, do "bom berço"), tem sido enxovalhada nas redes sociais. À parte do mau gosto desses posts, e de muitos desses tipos que se vê por aqui, com ataques diretos a pessoas que não se enquadram no senso imposto de estética, nível social, cultural ou o que quer que seja usado para nos deixar parecendo especiais diante desses outros "seres inferiores", o ódio vomitado pela moça jovem e bonita ainda nos surpreende a muitos. Sou nascido na Paraíba e não consigo entender porque o meu lugar de nascimento me faria inferior (ou superior) a quem nasceu em Erexim, Shangai, Santana de Ipanema, Barcelona ou Piracicaba. O curioso é vermos a pobreza (imaginária ou real) dentro da pobreza e do preconceito. O São Paulo e o país onde a moça nasceu podem ser tratados por nova iorquinos ou madrilenos com o mesmo desdenho que ela ofereceu aos “nordestinos que não são gente”. Será que ela se apercebe disso? Que londrinos poderiam achar que “ela não é gente” por causa de seu lugar de nascimento? Seria ignorância dela e deles se assim o fizessem ou se disso não se apercebessem... Que bobagem achar que os poemas de Manuel Bandeira, as peças de Ariano Suassuna ou as canções de Caetano e Gil seriam melhores (ou piores) se eles tivessem nascido em algum rincão do Centro Oeste, Sul ou Sudeste do Brasil. Momento de ódio e desapontamento, talvez, porque seu candidato havia perdido as eleições para Presidente. Queria “culpados” e achou que “matar um nordestino” seria um bom começo... Não a tenho ódio ou desejo de vingança como muitos na rede demonstram (talvez muitos deles com seus próprios preconceitos guardados a sete chaves, sejam nordestinos, sulistas ou sudestinos – curioso que essa palavra nunca é usada. A ouso, de maneira conciliatória, aqui). Em verdade, sinto-me tocado e dou-lhe (ainda que não me peça ou dela não precise) a indulgência por sua inocência, ignorância e preconceito adquirido no seio de uma Sociedade que assim a desenhou ou por ela se ter permitido ou se conduzido a isso. Quantos por aí não sentem o mesmo, mas não se descuidam publicamente como a moça fez? Cometeu um erro e foi condenada. Esperemos que aprenda e cresça em sua humanidade, ao mesmo tempo em que dizemos, em alto e bom tom, que isso não é aceitável. Digo sempre que pessoas legais e estúpidas se encontram em todos os lugares, de Recife a Nova Deli, de Porto Alegre a Hong Kong. A moça não divide a opinião com a maioria dos seus conterrâneos, tenho certeza. Eu não fiquei alegre vendo as duas torres caindo, como vi alguns, pois sei que aquele país onde vivi durante um ano não foge a essa regra universal de bondade e maldade, de discernimento e preconceito. Não se deve pregar a vingança ou o ódio, mas o entendimento e a sensação de solidariedade com todos (e a Lei onde ela, bem aplicada e dosada, se fizer necessária). Não me sinto, como nordestino, aviltado pelas palavras da moça. Já viajei o suficiente pelo mundo para não me render a esses estereótipos que fazem do meu país, da geografia do meu nascimento, e, nesse caso da moça, da região Nordeste, o que chamarei aqui de “um fatalismo geográfico”. De outro lado, não me parece bem aqueles que se investem do preconceito alheio e passam a defender as belezas de “sua terra” como superiores; soa-me um sentimento de colonizado mal resolvido, que sempre acha que está sendo “discriminado” por algum motivo. Hoje tomei meu café da manhã na padaria. A moça me serviu o sanduíche e trocamos risadas agradáveis sobre piadas bobas. Isso já me aconteceu da mesma forma em São Paulo, Beijing, Paris, João Pessoa e Durban. O mesmo sorriso, a mesma compreensão de compartilharmos a mesma humanidade. Espero, de verdade, que as moças e moços partilhem dessa ideia e desse sorriso. 

3 comentários:

  1. Professor ótimo texto, parabéns, gostei muito de suas palavras principalmente ao comparar as situações com sua experiência de vida em vários locais do mundo.
    Nos somos um país privilegiado pela grande diversidade regional, cultural e religiosa de nosso amado Brasil, que não merece ter descriminações.

    ResponderExcluir
  2. Diante da bela diversidade social, cultural, econômica, intelectual e moral entre indivíduos do mundo, países, regiões, cidades, bairros, instituições educacionais, ambientes profissionais, famílias, amigos..., infelizmente o “HOMEM” na sua íntima concepção de sociedade, conceitos e preconceitos, ainda não despertou para compartilhar diferenças. O exótico da diversidade é que podemos conhecer, vivenciar, aceitar ou discordar das diferenças, sem nos considerarmos superiores. Seres que ainda cultivam instintos “medíocres”, apenas prolongam a estrada à maturidade do senso moral. Diante de uma enfermidade chamada “CÂNCER DE PENSAMENTO”, como penalizar essa criatura sem nos sentirmos também com sintomas degenerativos? O Bom e ao mesmo tempo complexo é que o tratamento para esse tipo de câncer só depende de cada ser.

    ResponderExcluir